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O CONCEITO DE AMOR AO PRÓXIMO E A CANETADA DA MORTE DO STF


Por Thiago Duarte Gonçalves, trabalhador público da Justiça do Trabalho

A ideia de “amar ao próximo” vem de Jesus Cristo. Por óbvio, quando se diz o próximo, não se fala de um parente ou amigo querido, mas do diferente, daquele que não (pouco) conhecemos. É um conceito revolucionário, pois pressupõe renunciar em nome do outro que é diferente na sua cultura ou modo de viver ou quem mal sabemos quem é.

Desde o ano passado, a maioria dos deputados federais em Brasília atacou o conceito de amor ao próximo. Em menos de dois dias, foi aprovado um projeto que rasga a CLT e os direitos sociais garantidos na Constituição. Era o PL 4330/2004, que ampliava a terceirização.

Graças à mobilização da sociedade e de entidades em defesa dos direitos sociais,  pouco se avançou na matéria no Senado. Pois bem: amanhã, quarta-feira, dia 09/11/2016, o STF inicia o julgamento para decidir se é permitida a terceirização em qualquer setor da empresa ou não, podendo afetar também empresas públicas.

Hoje, a terceirização é permitida somente em casos específicos, nas chamadas atividades-meio (limpeza e segurança são os exemplos notórios). No entanto, a depender da decisão do STF, isso vai mudar: será possível terceirizar a atividade-fim, ou seja, qualquer setor da empresa ou do serviço público. Teremos escolas sem professores, hospitais sem um médico registrado, tudo por meio de empresas especializadas em intermediar mão-de-obra.

Somos aproximadamente 45 milhões de trabalhadores, sendo 12 milhões de terceirizados. Mas afinal, por que a terceirização da atividade-fim é tão cruel? Pesquisas comprovam que os terceirizados trabalham mais (cerca de 3 horas por semana), ganham menos (aproximadamente 25%), permanecem menos no emprego (maior rotatividade) e sofrem mais acidentes do trabalho.

Vejam. Não sou eu que estou dizendo, mas pesquisas, estudos e dados mostram essa triste realidade.

Quanto aos acidentes do trabalho, os mesmos estudos mostram que em alguns setores chega a 80% (comparado com os celetistas) o número de acidentes com terceirizados que resultam em morte.

Destaca-se que ainda hoje há resgate de trabalhadores que são submetidos a condições análogas de escravidão, apesar de tal conduta ser crime. Entre 2010 e 2013, nas dez maiores operações de resgate de trabalhadores em situação análoga à escravidão, quase 3 mil dos 3.553 casos envolviam terceirizados.

Assim, qualquer decisão do STF que permita ampliar o número de mortes no ambiente de trabalho em relação à terceirização, trata-se, na prática, de uma canetada da Morte. São vidas que são vão, são filhos sem mães e pais, são histórias que se acabam antes do tempo. Sofrimentos que só podemos mensurar quando perdemos um dos nossos.

Ora, e por que as empresas terceirizam, já que só temos notícias ruins? Porque o lucro é maior, simples assim. De novo: não sou eu que acho, mas 91% das empresas, segundo outra pesquisa feita pela CNI. É capitalismo, estúpido!

Da maioria dos deputados e senadores, não há o que se esperar: suas campanhas são financiadas por empresas que depois cobram a conta. Como diz o ditado, quem paga a banda escolhe a música. Campanhas milionárias para se eleger e comprometimento com o “patrão” que investe na sua campanha. Sabemos que só uma Constituinte exclusiva do sistema político pode mudar este panorama.

Teoricamente, isso não ocorre com os ministros do STF. No entanto, desde a “titularidade” de Michel Temer na presidência do país (ou seja, um pouco mais de dois meses), o STF tomou algumas decisões contrárias aos direitos sociais como nunca antes visto, tais como: suspensão da Súmula 277 do TST, nulidade da desaposentação, corte de salários de trabalhadores que aderem à greve, reconhecimento do negociado em detrimento do legislado, entre outras. Assim, ao invés de resguardar os direitos sociais estatuídos na Lei Maior, os Ministros do STF estão retirando estes direitos, fazendo o papel que outrora cabia aos congressistas.

Diante deste cenário e dos demais ataques (PEC 241, reforma da previdência, entre outros), diversas centrais sindicais e movimentos sociais, de matizes ideológicas diferentes, estão chamando uma paralisação nacional para os dias 11 e 25 de novembro. De norte a sul do nosso país, haverá manifestações e greves contra a canetada da morte e em favor da vida (além de outras pautas). Só a pressão de milhares, nas ruas e nas redes sociais, fará com que não haja a ampliação da terceirização para a atividade-fim da empresa.