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17/07/2019 16:48:25

Concurso de crônicas: Aojustra divulga outros dois textos participantes
Cinco primeiros colocados serão contemplados com viagem para Colônia de Férias conveniada com a Associação.

A Aojustra divulga abaixo outros dois textos recebidos para Concurso de Crônicas sobre o trabalho na execução dos mandados. O intuito é registrar a atividade do Oficial de Justiça, através de histórias reais que podem ser engraçadas, sensíveis, inusitadas ou até sobre os riscos enfrentados no cumprimento das ordens judiciais. 

Os cinco primeiros colocados serão contemplados com uma viagem para Colônia de Férias em Caraguatatuba conveniada com a Associação, além de outros prêmios que serão entregues aos participantes durante a confraternização de final de ano da Aojustra.

Para participar, o Oficial deve enviar a crônica para os e-mails aojustra@outlook.com e ane.galardi@gmail.com. É importante que o texto esteja devidamente identificado com o nome completo do autor, bem como a lotação e um número de telefone para contato. 

“A cada nova semana a Aojustra recebe textos de colegas Oficiais com histórias reais do dia a dia na função. Convidamos mais Oficiais a se inspirarem e nos enviarem crônicas para que consigamos implementar a ideia da elaboração de um livro”, afirma o presidente Thiago Duarte Gonçalves.

O prazo para participação no concurso da Aojustra termina em 10 de agosto. 

Na divulgação desta semana, a Aojustra apresenta os textos enviados pelos Oficiais Rogério Santos de Carvalho e Valdecir Celestino.

Confira as duas crônicas:

Gulliver
Por Rogério Santos de Carvalho (54ª VT/SP)

Naquela manhã fria de inverno, este carioca radicado parcialmente em São Paulo caminhava pelo lado do sol da Rua Joaquim Floriano para cumprir mais um mandado de penhora. Confesso que mesmo depois de vinte anos no mister de Oficial de Justiça, nos quais militei a maior parte do tempo nas varas cíveis, de família e criminais da justiça estadual, em que os mandados ditos mais complicados são cumpridos, nada me constrange mais do que um mandado de penhora, carro-chefe da justiça do trabalho. Entrar na casa dos outros, vasculhar garagens, fábricas e demais estabelecimentos, avaliar um bem mesmo sem expertise para tal, convenhamos, é muito chato.

E aquele mandado foi especialmente chato. Era para penhorar um veículo do sócio da claudicante empresa de brinquedos Gulliver, aquela mesmo do Forte Apache da minha infância e que recentemente entrou com pedido de recuperação judicial. Era um brinquedo símbolo de status. Quem o possuía era popular entre a molecada, o que não era o meu caso, posto que muito caro e meus pais não tinham a mínima condição de me dar, obrigando-me a filar dos meus primos e amigos. Aquilo era constrangedor. Eu queria tanto um daqueles, com cavalinhos, índios, o General Custer mandando bala nos pele-vermelhas, naquele genocídio romantizado, que a inocência e ignorância da história nos faziam achar tudo tão lindo e heroico. Anos mais tarde, vieram aos caminhões mini-basculantes e outros brinquedos da marca, estes sim eu comprei com certa facilidade, livrando minhas crianças do vexame de bater da casa de amiguinhos para brincarem. Já nesses tempos, os Forte-Apaches não eram mais moda. Ainda bem.

Quando ao mandado em si, o sócio destinatário era um homem de cerca de quarenta anos, com a depressão estampada no semblante, o qual desceu e me recebeu na portaria do prédio. Disse que o carro não estaria lá. Eu disse a ele que precisaria olhar a garagem. Ele relutou, e eu disse que seria melhor que permitisse a entrada senão chamaria a polícia, aquelas coisas chatas que somos obrigados a falar. Entrei vi o carro. Ele disse que era da irmã. Pedi os documentos e ele não os apresentou. Chatices de praxe. Penhorei assim mesmo aquele Ecosport de uns dez anos de uso. Carro velho para o dono do Gulliver.

Qual o conflito desta narrativa que retrata uma diligência tão prosaica na rotina do meirinho? Pouco ou quase nenhum, exceto a constatação in loco da iminente bancarrota de uma empresa tão emblemática e significativa na minha vida, e certamente de muitos de minha geração.


Essa é de deixar qualquer um maluco
Por Valdecir Celestino

Acho que as crônicas aqui contadas remetem um pouco à loucura e ao medo a que somos expostos todos os dias. A primeira delas aconteceu com duas colegas Oficialas de Justiça da mesma vara em que eu estava lotado.  Vou omitir os nomes.  As duas já se aposentaram. A mais antiga no cargo não dirigia, e quando as diligências eram mais distantes, inclusive em área rural, a mais nova dirigia, e uma fazia companhia para a outra, trabalhando em dupla. Uma delas, já afetada pelo stress laboral do dia a dia, vinha fazendo terapia para aguentar a barra. E em uma dessas consultas,  o médico a aconselhou: “Olha, quando estiver muito estressada, tira os sapatos, pisa na terra, abraça uma árvore, você vai se sentir melhor”. Em um determinado dia, em uma semana chuvosa, lá iam as duas por uma estradinha de terra lá pros lados de Xororó da Serra, quando o carro encalhou naquele local ermo, no meio do mato, e não tinha meio de sair do lugar. Foi aí que o pior aconteceu. A colega, em um arroubo, saiu do carro, atirou a chave o mais longe que conseguiu, tirou os sapatos e entrou para o meio da floresta, deixando a outra sozinha. Quando achou uma árvore bem legal, se atarracou nela. Acontece que tinha ali um enxame de marimbondos, que para acabar de lascar, veio para cima dela, que voltou correndo para o carro. Foi aí que passava um senhor, e perguntou o que estava acontecendo. A outra  explicou que não conseguiam tirar o carro, que estava encalhado. Ele ofereceu ajuda e pediu a chave. Que chave? Quando soube da estória toda, perguntou onde ela tinha jogado, saiu a procurá-la, e por sorte a achou, e logo depois conseguiu tirar o carro do local. Mais tarde elas chegaram contando o que aconteceu e, no final, tudo acabou bem.

No segundo “causo” eu estava presente. O colega Ricardo Lemos, com dificuldades para citar um executado, resolveu ir em um final de semana, porém como o bairro era perigoso, lá na periferia da periferia, pediu que eu fosse com ele. Em um domingo de manhã estávamos eu e ele batendo palmas na porta do executado, porém ninguém atendia. A moradora da casa em frente informou que podíamos insistir, que ele havia ficado com o boteco aberto até de madrugada, estava dormindo, mas estava em casa. A partir daí Ricardo começou a gritar o nome do executado. Logo depois, percebi que o papagaio daquela senhora da casa em frente também estava esgoelando o nome do executado e achei engraçado. Depois de um tempo, o dito cujo desceu para nos atender, e no exato momento em que Ricardo deu a ele ciência do valor a ser pago, o maledetto do papagaio começou a gritar: Crau, crau, crau, crau, crau, crau.....  música que tocava o dia todo na nossa rica programação cultural radiofônica, mas que traduziu direitinho a situação em que o sujeito se encontrava. Foi aí que fui pego por meu momento de loucura, não me aguentei. Sofri uma crise de riso incontida na frente do executado, e logo saímos de lá, felizes por termos conseguido citá-lo.  O referido é verdade e dou fé.

CLIQUE AQUI para ler todos os textos enviados para o concurso da Aojustra

Da assessoria de imprensa, Caroline P. Colombo